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Minissérie ‘Justiça’ é bárbara, mas também força a barra. Veja aqui …

Minissérie é das melhores produções feitas pela Globo nos últimos anos, mas não escapa de ter suas falhas

Justiça, a minissérie de Manuela Dias que se encerra nesta sexta-feira, na Globo, é de uma qualidade acima da média. Com quatro grandes histórias que se cruzam e se recusam a fazer concessões ao espectador, e por isso mesmo o surpreendem, Justiça se sagrou como um dos acertos da TV neste ano. Isso não impede, contudo, que o programa tenha as suas derrapadas. Reunimos seis pontos que poderiam ter sido mais bem trabalhados na série. aqui

A alcunha de gato, usada para designar aquele jogador que finge ser mais novo para disputar partidas de categorias inferiores, caberia bem a Téo (Pedro Nercessian), o playboyzinho que está há pelo menos nove anos envolvido com a vida universitária. No primeiro episódio de Justiça, o garoto, que era amigo de Vicente (Jesuíta Barbosa), quis seduzir a sogra dele, Elisa (Debora Bloch), levando-a para jantar e para falar de seus planos para o futuro: fazer mestrado e morar na Suíça. Na despedida, em frente ao restaurante, Elisa dá um toco no menino, dizendo para procurá-la em dois anos, quando terminasse a faculdade. “Tá bom, dois anos”, diz Téo, sem tirar o sorriso da cara. Então, a minissérie salta sete anos, para 2016, e eis que encontramos Téo entre os alunos de Elisa, que é professora de uma disciplina do primeiro ano de uma faculdade de Direito. É claro que o playboyzinho pode ter mudado de curso, se afastado por um (longo) tempo ou prestado vestibular novamente. Mas a situação toda é, no mínimo, estranha.

Que Antenor (Antonio Calloni) é um patife, não há dúvida. Foi capaz de roubar o próprio amigo, seu sócio em uma empresa de transporte público, e, na fuga para o aeroporto, atropelar e deixar sem socorro uma mulher – Beatriz (Marjorie Estiano), noiva do contador Maurício (Cauã Reymond). Passou um tempo no exterior e agora, com o dinheiro roubado, é candidato a governador de Pernambuco. Vira e mexe, menciona a sua “campanha” no ar, como quando quer abafar os crimes cometidos pelo filho playboy, Téo. Tudo errado, claro. Mas ainda mais errado parece ser o cargo pleiteado pelo personagem de Antonio Calloni. A minissérie, de toada realista, se passa em 2016, e este é um ano de eleição a… prefeito.

A ideia de que a trama de Justiça se assemelhe a uma malha – ou teia – em que as suas diversas histórias e personagens se cruzem é louvável, para não dizer sensacional. O roteiro, contudo, parece ter sido amassado em algumas partes para caber nesse formato.

Fátima (Adriana Esteves) passou sete anos presa, período em que perdeu o marido, a filha se tornou prostituta e o filho, trombadinha. Apesar de tanta tragédia, algo na sua vida permaneceu de pé, e na íntegra: a sua casa. Não se sabe quando as crianças, sem pai e sem mãe, deixaram o local, mas enquanto a doméstica esteve na cadeia a residência se viu um bom tempo abandonada, período em que o mato cresceu feito cabelo sem tesoura e, incrivelmente, nenhum objeto foi levado por um visitante indesejado. Que o diga o enorme facão que Fátima saca do meio do matagal ao voltar da penitenciária, quando então se dedica a desbastar a área que pretende voltar a habitar. Essa nem o vizinho, o sargento que colocou drogas no imóvel para incriminar a faxineira, depois de ela matar seu cachorro, pensou em plantar por lá.

A ideia de que a trama de Justiça se assemelhe a uma malha – ou teia – em que as suas diversas histórias e personagens se cruzem é louvável, para não dizer sensacional. O roteiro, contudo, parece ter sido amassado em algumas partes para caber nesse formato. O ponto em que ele mais recebeu uns apertões para se adequar à proposta de Manuela Dias foi aquele – ou aqueles – em que figura Celso, o inacreditável personagem de Vladimir Brichta. Ou dá para acreditar que um mesmo homem toque um negócio durante o dia (um quiosque na praia) e outro na madrugada (uma sauna para os que procuram furunfar)? Que, além de se envolver com a prostituição, trafique drogas, forneça armas a quem precisa e ainda conheça a gangue trombadinhas que aterroriza o Recife de Justiça? E que – ufa, que fôlego – mantenha dois relacionamentos ao mesmo tempo, com a cafetina de que é sócia, vivida por Leandra Leal, e a ex-estudante Rose, presa por portar drogas que comprou com ele? Celso está em todas. Em todas, mesmo. Celso está em excesso.

Outro ponto que foi bem amassado pelos roteiristas, a cada golpe dos dedos contra o teclado, foi o encontro dos protagonistas da série na delegacia de onde todos partiram para a prisão, na primeira semana de Justiça. Não apenas todos se conheciam – exceto a estudante Rose (Jéssica Ellen), que no entanto namorava Celso, que, você já sabe, conhece todo mundo –, como foram detidos no mesmíssimo momento (o mesmo turno da delegacia) e seguiram para idênticos sete anos atrás das grades. Afinal, Fátima trabalhava como doméstica na casa de Isabela, que foi assassinada por Vicente, filho de um cliente do contador Maurício. Para piorar, uma mesma música – Hallelujah, aquela que embala a tristeza de Shrek ao acreditar que perdeu sua Fiona, no primeiro filme da série – acompanhava cada um dos personagens em seu calvário.

Também descobrimos com Justiça que Recife é uma cidade de proporções diminutas. Quando alguém resolve tomar um coco na praia, aonde vai? Ao quiosque de Celso, é claro. Mesmo que essa pessoa seja Fátima (Adriana Esteves), que nada tem em comum com ele além do fato de ser sua esposa – na vida real. E, na hora de pular a cerca com discrição, qual o lugar escolhido por todos? O motel onde Heitor (Cássio Gabus Mendes) traçou uma estudante da faculdade onde é reitor, o mesmo onde Vânia (Drica Moraes) se vingou de Antenor (Antonio Calloni) nos braços musculosos de Maurício (Cauã Reymond). Quem quer tomar uma cerveja à noite também vai ao mesmo bar – o boteco onde Firmino (Júlio Andrade) se apresenta, e Douglas (Enrique Diaz) e Mayara (Julia Dalavia) namoram e dão uma relaxada. Saúde.

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